Quando comecei a escrever neste espaço, um dos temas mais candentes era a posse de Obama, lá em janeiro de 2009. Lembro que dediquei algumas postagens a este fato, repercutindo inclusive seu discurso de posse. Confesso que não era dos mais céticos e chegava a nutrir algumas esperanças de que fosse possível um novo patamar de relações internacionais! Claro que isso era pura ingenuidade da minha parte!
Nos últimos dias, as principais cidades norte-americanas foram arrebatadas por grandes manifestações em protesto às políticas de Barak.
As manifestações foram também uma oportunidade para mostrar que a população não está satisfeita com a atuação de Barack Obama, já que boa parte de suas promessas continua no papel. Em artigo para a Radio del Sur, Victor Toro esclarece a necessidade das mobilizações populares nos Estados Unidos. "A recessão não parou, o desemprego ultrapassa os 20%, em alguns povos e cidades se manifesta mortalmente em até 30%, a isso agreguemos o desemprego crônico, os desamparados, a população encarcerada, os dependentes químicos e doentes crônicos, há que os somar por milhões". Ver ADITAL
No mundo todo, protestos revelaram as repercussões da crise capitalista dos últimos tempos. na Europa a taxa de desemprego média chega a 10%, com alguns países um pouco acima desse número.
Enquanto isso, no Brasil, onde temos uma cultura de conciliação, a maioria das atividades foi festiva.
-----------------------------------
Mas coincidiu com o 1º de Maio a leitura do livro de Mário Sérgio Cortella; "Qual é a tua obra?".
Título instigante e leitura idem!
Cortella - que trabalhou diretamente com Paulo Freire e isso, por si só, já é um grande currículo - desenvolve um texto saboroso, de leitura tão fácil quanto profunda. Daqueles textos que te leva conversando com o autor.
Pensando sobre a questão do trabalho, ele traz várias reflexões, mas em especial no segundo capítulo (vou confessar, comecei a ler hoje e ainda tô na metade!), Cortella compara o sentido e a origem etimológica da palavra "trabalho" (do latim "tripalium", denota algo torturante e doloroso) e nos mostra, de forma simples, como esta visão persiste até hoje.
E então nos convida a revisar este conceito e pensar o trabalho como o termo grego "poiesis", que quer dizer "minha obra", "aquilo que faço".
É verdade que os gregos não viam assim todos os tipos de trabalho, e o próprio Platão considerava que somente "homens ociosos [corresponderiam] moralmente ao ideal de ser humano e [mereceriam] ser cidadãos por inteiro".
Esta comparação entre "tripalium" e "poiesis", me fez lembrar da reflexão marxiana sobre o trabalho alienado e a emancipação da classe trabalhadora, também lembrado pelo autor (tema propício para este dia!).
---------
Mas preciso confessar que o trecho que me deixou mais inquieto até agora foi quando o autor fala sobre o desejo e a busca de espiritualidade. Este trecho me tocou de forma direta:
"O desejo por espiritualidade é um sinal de descontentamento muito grande com o rumo que muitas situações estão tomando e, por isso, é uma grande queixa. E a espiritualidade vem à tona quando você precisa refletir sobre si mesmo; aliás a espiritualidade é precedida pela angústia. De maneira geral, a angústia é um sentimento sem objeto. Quando você fica triste, é por alguma coisa. Quando você está alegre, é por algum motivo. A angústia se sente e não identifica o objeto. Você se levanta e 'não sei o que está acontecendo, estou com uma coisa, um aperto aqui no peito'. É uma sensação de vazio interior.
Martin Heidegger, grande filósofo alemão do século XX, dizia que a angústia e a sensação do nada. E ela é positiva num ponto, pois o nada é a possibilidade plena. Quando se pode sentir o 'nada', todas as opções se apresentam e todos os horizontes são possíveis. (...) a espiritualidade é um desejo forte de a vida ter sentido, de ela não se esgotar nem naquele momento, nem naquele trabalho."
Mas como sempre vivi minha espiritualidade de maneira um pouco conflituosa, acabei lembrando de outra leitura que tem me inquietado. Um livrinho de Pedro Demo, chamado "AUTO-AJUDA: Uma Sociologia da Ingenuidade como Condição Humana".
"No fundo a espiritualidade é importantíssima porque oferece um dos horizontes fundamentais da vida, que é sentido. Como a proposat de sentido nunca está necessariamente isenta de ilusões, a espiritualidade não deixa de ser dúbia: quando se acomoda em religião específica, tornando-se fundamentalista, pode tornar a pessoa aind amais feliz, por conta de certezas que embalam um mundo tão incerto, ma sisso é pago com alienações preocupantes ou mesmo insuportáveis para espíritos mais críticos."
E por aí vou...
(continua)