Mário Sérgio Cortella conta sobre a visita de dois xavantes em São Paulo, nos anos 70 (do século XX é preciso dizer!!).
Entre outros lugares, foram levados até o Mercado Municipal, onde:
"Eles deram dois passos e ficaram pasmos. Pilhas de alface, d etomates, de cenoura, de laranja. Ficaram com o olhar talvez como o nosso olhar ficaria se entrássemos no cofre de um banco. Em certo momento, um deles viu uma coisa que nenhum e nenhuma de nós veria. Ele cutucou e perguntou: "O que ele está fazendo?' E apontou no chão um menino negro, pobre (a gente sabia que era pobre por causa da roupa, ele não saberia) pegando alface pisada, tomate estragado, batata já moída e colocando num saquinho. Nenhum e nenhuma de nós veria aquilo, pois para nós era normal. Normal?"
O relato de Cortela sobre esta passagem, continua com a manifesta perplexidade dos indígenas com aquela situação: com todas as pilhas e pilhas de comida boa, porque aquele menino pegava a comida estragada?
Nós saberíamos responder esta questão. Nós entenderíamos aquilo. E até aceiteríamos, de certa forma.
Os xavantes, inconformados, resolveram "Vamos embora"! Eles eram "selvagens" demais para entender...
"Eles não conseguiram compreender essa coisa tão óbvia: que uma criança faminta, diante de uma pilha de comida boa, pega comida podre. Eles não são civilizados. Sabe como ele passaria batido e nem repararia nessa cena? Se ele tivesse frequentado algumas de nossas escolas, se ele tivesse ido a algumas de nossas igrejas, se ele tivesse assistido a alguns de nossos meios de comunicação. Aí ele ia achar aquela cena normal."