quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Qual tempo temos?

- Bom dia - disse o pequeno priíncipe.

- Bom dia - disse o vendedor.

Era um vendedor de pílulas especiais que saciavam a sede.  Toma-se uma por semana e não é mais preciso beber.

- Por que vendes isso? - perguntou o principezinho.

- É uma grande economia de tempo - disse o vendedor. - Os peritos calcularam. A gente ganha cinquenta e três minutos por semana.

- E o que se faz com esses cinquenta e três minutos?

- O que a gente quiser...

"Eu", pensou o pequeno príncipe, "se tivesse cinquenta e três minutos para gastar, iria caminhando calmamente em direção a uma fonte..."

Por que tenho visto e sentido o tempo de forma diferente.

domingo, 19 de dezembro de 2010

ESQUERDA: próxima tarefa


Num texto que já data de quase dois anos atrás, Boaventura de Souza Santos, ao analisar a questão cubana, pontua alguns dos principais dilemas da esquerda mundial para o século XXI.

E, apesar do tom ameno e reformista, Boaventura começa delimitando algo fundamental: Esquerda (ser de) é pensar para além do capitalismo.

Esquerda é o conjunto de teorias e práticas transformadoras que, ao longo dos últimos cento e cinquenta anos, resistiram à expansão do capitalismo e ao tipo de relações económicas, sociais, políticas e culturais que ele gera, e que assim procederam na crença da possibilidade de um futuro pós-capitalista, de uma sociedade alternativa, mais justa, porque orientada para a satisfação das necessidades reais das populações, e mais livre, porque centrada na realização das condições do efectivo exercício da liberdade. A essa sociedade alternativa foi dado o nome genérico de socialismo.

Com esta definição, muitos grupos, organizações e partidos já ficam de fora da conversa.

E então a reflexão começa a ficar ainda mais interessante! A crítica ao modelo tradicional (sic) de socialismo marxista formulado a partir dos países de capitalismo avançado – durante muito tempo considerados os únicos lugares onde a experiência socialista poderia florescer. Este pensar desconsiderou, por cerca de um século e meio o potencial revolucionário da América Latina e na África. (Podemos destacar um exemplo dado pelo próprio autor citando a “desobediência” cubana ao apoiar a independência de Angola contrariando os próceres de Moscou ou ainda, a simpatia manifestada por Marx na época da tomada de territórios dos mexicanos pelos “engenhosos” estadunidenses.

Pois esta visão do desenvolvimento das forças produtivas até um limite de exploração e desigualdade insustentáveis como requisitos para a implantação de experiências socialistas foi sendo derrubada pela História; pelo protagonismo camponês, feminista, lgbt, afrodescendente, estudantil, juvenil...

O determinismo economicista que já foi revisado até mesmo na literatura marxiana, hoje é revisto sobre outras bases. O capitalismo precisa ser superado por formas de produção alternativas. Isso desde sempre! A novidade é a percepção de que tal superação e a construção das outras formas de produção passam (passarão / estão passando) pelo implemento de avanços fundamentais nas relações de poder e em especial no debate sobre a democracia:

Podemos resumir esta inovação afirmando que a esquerda decidiu finalmente levar a democracia a sério (o que a burguesia nunca fez, como bem notou Marx). Levar a democracia a sério significa não só levá-la muito para além dos limites da democracia liberal, mas também criar um conceito de democracia de tipo novo: a democracia como todo o processo de transformação de relações de poder desigual em relações de autoridade partilhada.
E aqui entra algo fundamental para o momento da experiência política brasileira: o amadurecimento da democracia com a ampliação dos direitos para largas parcelas da população, iniciada com os dois mandatos de Lula, precisa ser radicalizada no Governo Dilma com o avanço da chamada democracia participativa (ou direta ou colaborativa ou genuína ou contra-hegemônica ou...). Com a ampliação do poder popular e do controle público sobre obras e programas. Investindo em debates setoriais e na construção de marcos regulatórios para setores estratégicos (energia, comunicação, comércio interno e externo, Pré-Sal, etc...), trabalhando na perspectiva do que Boaventura chama de “constitucionalismo transformador” em um “Estado experimental”.

Os desafios são imensos, tanto quanto as possibilidades.

P.S.: Para conhecer o texto de Boaventura na íntegra, com a reflexão sobre Cuba CLICA AQUI.

P.S. ii: Essa é a pauta pra domingo à tarde, logo vê-se que a coisa não está fácil!

P.S. iii: Em breve espero poder escrever sobre algumas democratizações necessárias, desejáveis e urgentes!

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Segunda-feira #13 SONHO RUIM

Acordei de sobressalto! Tenho sonhado muito nas últimas semanas. Em geral coisas cotidianas. Banais. Os tradicionais voôs. Disseram que muito sonhar é sinal de bom sono e/ou de uma fase de criatividade. É verdade que tenho estado "+ bem" do q mal, mas...
Hoje o sonho foi estranho. Rápido. Ligeiro. E cheio do inusitado.

Primeiro pelo cenário: a casa do meu pai; onde passei minha infância e adolescência. Segundo: pela presença da minha mãe na cena. E, por fim, pela situação em si.

Estava sentado na velha mesa da cozinha e fui chamado na frente de casa. Lá estava o mesmo muro; o portão de ferro com o cadeado, a calçada, o gramado lateral estava verdinho...

Estranho! Era a polícia! E ao me identificar perguntou se eu conhecia um relógio e umas pulseiras que eles haviam encontrado. Quando cheguei perto pra poder ver, o "puliça" atirou o "enxerto" dentro do meu pátio e me deu voz de prisão, que ali estava a prova do crime! (agora, escrevendo, eu acho até muita graça) !!

Grito pra dentro de casa! A luz apaga! O olho abre! E não sonhei mais outra vez ainda...

E o pós-sonho?
Perdi o sono. 5 h da manhã!
Ficar refazendo cada momento, tentando extrair significados, lições...
Preocupa o sentimento de receber uma culpa que não te pertence. Ou de se estar realmente inseguro frente ao mundo.

Ou pior ainda... preocupa perder tempo e isso tudo, simplesmente, não significar nada!

sábado, 4 de dezembro de 2010

Vitória de Pirro


Pirro tentou mais uma vez invadir a Itália romana. Isso aconteceu em 275 a.C.., mas nessa oportunidade seu exército foi derrotado na batalha de Beneventum. Diante desse fracasso ele retornou à Grécia e conquistou militarmente a Macedônia, atacando depois Esparta. Foi durante essa campanha que encontrou a morte em uma das vielas da cidade de Argos. 

Por ter sido um homem impressionantemente belicoso e um líder infatigável, embora não tivesse sido um rei propriamente sábio, Pirro foi considerado um dos melhores generais militares do seu tempo. Aníbal considerou-o o segundo melhor, a seguir a Alexandre Magno. Pirro era também conhecido por ser muito benevolente. Como general, as maiores fraquezas políticas de Pirro eram a falta de concentração e apetência para esbanjar dinheiro (grande parte dos soldados que integravam suas tropas eram mercenários dispendiosos). 

A trajetória militar do rei de Épiro em sua obstinada intenção de construir um império na Itália, deixou como herança a expressão vitória de Pirro, usada para simbolizar tudo aquilo que se consegue a um custo bem mais alto que as vantagens obtidas. 


CREATIVE COMMONS http://www.fernandodannemann.recantodasletras.com.br/visualizar.php?idt=491021

sábado, 27 de novembro de 2010

(RE)FLEXÕES DO AMAR - Débora Marshall


(RE)FLEXÕES DO AMAR


Hoje é tempo de amar
Infinitivo enquanto dure

Imperfeito amava no passado
Amor mais-que-perfeito: eu amara indefectivelmente

Amo-te...
Indicativo de amor presente

Deixa que eu te ame!
E se me amasse, amar-te-ia pra sempre

Amor-gerúndio:
amanhã vou estar te amando mais do que hoje

Sei que te amarei
Meu futuro: tu presente

Particípio-te que és amado
Ama-me! É imperativo...

Românticas conjugações
Em tempos difíceis

De amores líquidos
De modos estranhos

Meu modo de amar: incondicional
Meu tempo urge...

Pois amar é urgente
E meus versos não mentem.

*Débora Marshall - Além de uma grande colega, descobri que também é poetisa. A poesia acima foi premiada num concurso literário promovido pelos Franciscanos aqui em Santa Maria, no ano de 2008.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Ao vivo! Tariq Ali no Ceará !


Prefeitura de Fortaleza traz historiador Tariq Ali na 3ª edição do projeto Tópicos Utópicos
Para a terceira edição do projeto Tópicos Utópicos, a Prefeitura Municipal de Fortaleza traz o historiador, escritor, cineasta e ativista político britânico paquistanês Tariq Ali. Com o tema “Os fundamentalismos e os desafios democráticos”, o evento acontece hoje (25), às 19 horas, no Mercado dos Pinhões.
No debate, Tariq Ali fará uma explanação sobre a relação entre os fundamentalismos religioso e imperial, apontando como estes interferem na disseminação de instituições e valores ditos democráticos. Neste contexto mundial globalizado, Tariq pode nos possibilitar um olhar menos ocidental do que o costumeiramente apresentado para o cidadão comum. Após o debate, o escritor autografará seu livro: “O Poder das Barricadas”, de 2008 da Boitempo Editorial.
O Tópicos Utópicos é um convite ao pensamento sobre a conjuntura mundial atual. Com quatro encontros anuais, a intenção é referenciar Fortaleza como polo de reflexão sobre política, economia, cultura, meio ambiente. O projeto é realizado através da parceria entre a Comissão de Participação Popular, a Secretaria de Cultura de Fortaleza (Secultfor), a Universidade Federal do Ceará (UFC), a Editora Boitempo e a Escola Nacional Florestan Fernandes.
O primeiro encontro, ocorreu em maio deste ano e teve como convidado o filósofo Domenico Losurdo. Já em outubro,  Fortaleza recebeu o sociólogo Michael Löwy. Em dezembro, o projeto encerra os debates de 2010 com a presença do sociólogo Emir Sader, no dia 11 de dezembro.
Tariq AliNascido e criado em Lahora (então parte da Índia colonial), atual Paquistão, no seio de uma família comunista. Tariq Ali estudou na Universidade do Punjab, mas por causa de seus contatos com movimentos estudantis radicais e temendo por sua segurança, seus pais o enviaram à Inglaterra. Em uma nova Universidade, Oxford, cursou ciências políticas, economia filosofia.
Entretanto, sua personalidade só pôde ser verdadeiramente notada durante a Guerra do Vietnã (1959-75). Ocasião em que manteve debates com personagens centrais, tais como Henry Kissinger*. E ainda na década de 60, fez amizade com figuras influentes como Malcolm X (ativista negro dos Direitos Humanos nos EUA), Stokely Carmichael (ativista negro do Movimento dos Direitos Civis nos EUA), Mick Jagger, John Lennon e Yoko Ono.
Publicou mais de uma dezena de livros sobre história e política internacional, além de várias novelas ficcionais. Seu livro mais recente é "The Obama Syndrome: surrender at home, war abroad", de 2010.
:: SERVIÇOTópicos Utópicos com Tariq Ali
Data: Quinta-feira, 25 de novembro
Horário: 19h
Local: Mercado dos Pinhões (entre as ruas Gonçalves Ledo e Ten. Benévolo)
TRANSMISSÃO AO VIVO:
WWW.FORTALEZA.CE.GOV.BR 




Já vai começar!!!!!!!!!!!!!!!

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

A chegada

03.11.2010
Chego no meio da noite. A terra é fria, mas dizem que é santa. Carona só as 7h30min. Sobra tempo; falta é lugar.
Vou pro bar da rodoviária; aqui eufemisticamente chamado de "local de encontro". Não é eufemismo: é sério! Encontro conterrânea vindo fazer registro no Conselho de Veterinária. Papo vai, papo vem, já é 5h.
Da sacola pula um Hans Staden que peguei apressado antes de sair de casa ontem. Já havia lido. Era o que estava à mão. De qualquer maneira, só a introdução do Peninha já é um ótimo tiragosto. Assim como escapou dos selvagens, Hans Stadem me escapa [da atenção]. Prefiro devorar um pastel de calabresa e queijo e uma xícara de café. Iguaria! Comparável aos pastéis chineses da rodoviária de um outro porto, quase na mesma latitude.

Volto à conversa. Planos. Dúvidas. Recomeços.
Empresto um livro e a conversa emudece. Segue silenciosa. Cada um em suas páginas.

Penso que é muita sorte ganhar uma nova chance aos 31! Acho que não é para muitos! Apesar d e que sempre há tempo...
Penso no Hans - a esta altura estamos íntimos de novo!
Assim como Hans, me considero um cara que sabe muito de algumas coisas; mas nada de muitas outras! 
E, se ele conseguiu escapar da voracidade tupiniquim; de que apetites fujo eu?

O que Ubatuba foi para Hans Staden, espero que esta terra seja para mim: um lugar para renascer sem ter morrido!

A manhã chegou... Uma manhã diferente! Lembro da batida frase "o primeiro dia do resto da minha vida". Hoje será um desses! CERTEZA!


domingo, 21 de novembro de 2010

Sobre a normalidade...

Mário Sérgio Cortella conta sobre a visita de dois xavantes em São Paulo, nos anos 70 (do século XX é preciso dizer!!).
Entre outros lugares, foram levados até o Mercado Municipal, onde:

"Eles deram dois passos e ficaram pasmos. Pilhas de alface, d etomates, de cenoura, de laranja. Ficaram com o olhar talvez como o nosso olhar ficaria se entrássemos no cofre de um banco. Em certo momento, um deles viu uma coisa que nenhum e nenhuma de nós veria. Ele cutucou e perguntou: "O que ele está fazendo?' E apontou no chão um menino negro, pobre (a gente sabia que era pobre por causa da roupa, ele não saberia) pegando alface pisada, tomate estragado, batata já moída e colocando num saquinho. Nenhum e nenhuma de nós veria aquilo, pois para nós era normal. Normal?"


O relato de Cortela sobre esta passagem, continua com a manifesta perplexidade dos indígenas com aquela situação: com todas as pilhas e pilhas de comida boa, porque aquele menino pegava a comida estragada?
Nós saberíamos responder esta questão. Nós entenderíamos aquilo. E até aceiteríamos, de certa forma.
Os xavantes, inconformados, resolveram "Vamos embora"! Eles eram "selvagens" demais para entender...

"Eles não conseguiram compreender essa coisa tão óbvia: que uma criança faminta, diante de uma pilha de comida boa, pega comida podre. Eles não são civilizados. Sabe como ele passaria batido e nem repararia nessa cena? Se ele tivesse frequentado algumas de nossas escolas, se ele tivesse ido a algumas de nossas igrejas, se ele tivesse assistido a alguns de nossos meios de comunicação. Aí ele ia achar aquela cena normal."


segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Coisas de uma República em construção...

Antes de sair de Sta Maria meu chefe alertou "Bom feriado! E não se esqueçam que ESSA República só existe por causa nossa!". Entendi o recado!

Realmente ESSA nossa República de hoje não é mais a mesma! Não é mais uma República das Bananas; nem da Espada; já foi República Velha, Nova, Populista... Isto é o que nos diziam.

Lembrei do centenário de nossa República inacabada. 1989. "O ano em que quase lavamos a alma", nos dizeres de Ricardo Kotscho. Centenário da República incompleta, ainda hoje em construção...

"Sem medo de ser feliz". Esta conhecida frase, embalou muitos sonhos em 1989; foi o mote da campanha presidencial e depois título de um livro testemunho, lançado em abril de 1990.
Organizado por André Singer, o livro traz textos, depoimentos, uma bela entrevista com Lula e muitas fotos. Muitas mesmo!

Trechos emocionantes revelam detalhes da campanha de 89, quando o Brasil quase elegeu um operário, ainda de barba preta, presidente da República.

Alguns registros quase proféticos registravam e anteviam o fenômeno Lula: "Que fato político maior pode existir do que as multidões que Lula mobilizava por onde passava, mais do que qualquer outro candidato na história das eleições presidenciais?"

O "nunca-antes-na-história-deste-país" já fazia parte da trajetória de Lula!


Este livro foi presente da minha amiga  Suely; inclusive com uma foto "extra", de um comício em POA. Um grande comício em frente à Prefeitura. é possível identificar Olívio; Raul e, talvez o Tarso, no palanque, entre a multidão e o mar de bandeiras.

"Porque não se trata apenas de mudar de presidente". A frase na faixa de 89 caberia perfeitamente em 2010. E não falo apenas pela definição de um modelo de país, de Nação, de sociedade em detrimento de outro.

Eleger Dilma, a primeira mulher presidente da história é um sinal dos tempos. No 121º ano da República que, no seu começo, nem o voto permitia às mulheres; que relutou contra o divórcio e a afirmação do protagonismo feminino em todos os campos da sociedade, eleger Dilma é um marco.

Quando Lula, em 1º de janeiro de 2011, estiver passando a faixa para Dilma; um presidente eleito passando para outro(a) também escolhido pelo voto da sociedade, estaremos vivenciando algo raro: desde 1961, quando JK passou a faixa para Jânio Quadros, isto só aconteceu em 2003, quando FHC passou a faixa para Lula. Ou seja, em 50 anos, será apenas a 3ª vez!

Isto por si só é um sinal da consolidação necessária de nossas instituições republicanas!

Mas além disso: mais do que raro; o que veremos em 1º de janeiro próximo, será inédito:
um operário, já de barba grisalha, passará a faixa para uma mulher.

Isto sim é alternância de poder!
Isto sim "nunca-antes-na-história-desse-país" havia acontecido!

Construiremos mais um pouco desta nossa República com Dilma!

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Amor de bicho

Primeira noite! Cansaço. Expectativas. Canseira. Dúvidas. Exaustão. Desafios. Estafa...
Nem comecei a trabalhar ainda mas a Boca do Monte já me consumiu bastante. Muito calor. Caminhantes falavam em maior calor  desde não sei quando. Quem vem da fronteira sabe que existe coisa pior; não é tanto assim, mas já é muito quente!

Achei um hotel bem central, cercado por prédios residenciais. No meio da noite  fui acordado por alguns estranhos (apesar de conhecidos) sons vindos da vizinhança.

O primeiro vinha da direita da sacada. Começou estranho. Rápido. Crescente. Imaginei um casal. O ritmo acelerado das respirações me levava a crer que iriam chegar ao clímax dentro de instantes. Confesso que deu inveja durante um certo tempo.

Mas o show de sons ainda estava só no início. Num aoutra sacada acima, começam novos ruídos. Ainda mais selvagens, mas um pouco diferentes.

Logo percebi que, há poucos metros de mim haviam dois casais diferentes fazendo... amor?  sexo? garantindo a permanência de suas espécies?

Ahhh... deixa eu explicar o "espécies" assim no plural... é que um dos sons vinha de um casal de cães. O outro, a princípio era de gente - sim, era! Só gente avisa "AGOOOOORA!!!!!!!!!".

Mas o que me impressionou é que no meio daquela alucinação auditiva toda, em alguns momentos eu não sabia qual som vinha de que casal. Se biologicamente também somos animais, isso não deveria causar espanto.  Mas enfim, uma certa hora alguns uivos encerraram a sinfonia e eu pude encerrar minha noite de sono.

Ao acordar pensei: "É por isso que dizem que cachorro também ama como gente" !

Mais tarde compreendi que, às vezes, são as gentes que amam como cães!


quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Novos tempos

Quando surgiu a ideia de escrever um blog haviam algumas motivações específicas: a primeira era ir conhecendo a ferramenta para uso na educação, com a criação de blogs que centralizassem, partilhassem e divulgassem os trabalhos das turmas em dava aulas.

A segunda e mais decisiva na época, foi tentar construir um espaço de debate sobre as questões locais da política e da cultura uruguaianenses. Um observatório crítico - e bem humorado - da imprensa, da política e dos "bons" costumes da fronteira.

Para a primeira proposta valeu à pena com sobras.
Mantive no ar pelo menos 4 blogs de séries diferentes, no Colégio Marista e tb no Instituto Estadual paulo Freire e ainda um grupo de discussões - muito calado por sinal - para preparação ao ENEM.

Já na segunda, funcionou parcialmente. O acúmulo de trabalho diminuiu meu tempo para ser testemunha ocular da(s) história(s) do nosso cotidiano.

O blog virou uma página de encontros, uma plataforma de leituras onde acompanhei e repercuti/reproduzi alguns textos, imagens e reportagens que faziam sentido em cada contexto (e como diria minha amiga Maria do Carmo Victorino: "A conjuntura é dinâmica, Martins!").

Pelo menos, deixei claro desde o início que aqui nem sempre seria um espaço garantido de originalidade. Lembra

E assim fomos levando... desde janeiro de 2009! Com uma média acima de 15 acessos diários nos últimos seis meses (período em que instalei o contador !). Eu inclusive me pergunto "o q uma pessoa faz nesse blog?". se nem mesmo eu tenho vindo muito aqui? Nestes últimos dois meses em especial?

Vai saber!

Mas a partir de agora há tempo! São novos tempos!
Tempos em que operários dão a vez à mulheres! Tempos em que os #nordestistos de norte a sul do Brasil calam o #casal45! Tempos em que #bolinhaDePapel vira escárnio popular!

E tempos em que terei mais tempo!

E vou tentar escrever mais. Não vou chegar a fazer disso aqui um lugar de escritos muito intimistas,... até por quê, para isso, eu tenho meu diário pra escrever enrolado no edredon (uhasuashasuhasu)... mas vamos estar por aqui!

Na ponte aérea BOCADOMONTE / FRONTEIRA .

terça-feira, 5 de outubro de 2010

SERRA recebe declarações de apoio!

Enquanto isso, aguarda-se a posição de Marina Silva (PV). Cumpriu o papel dela de garantir o Serra no 2º turno. Mas e agora? Que papel cumprirá na definição desta eleição? Jogará o que resta de sua história no lixo? Ou honrará sua luta de seringueira? Sua miltância popular? Suas vivências com Chico Mendes?

Balanço inicial do primeiro turno - por Emir Sader

A esquerda teve o melhor resultado eleitoral de sua história: Dilma em primeiro lugar, governadores no Rio Grande do Sul, na Bahia, em Pernambuco, no Ceará, no Espírito Santo, Sergipe, Acre, boas possibilidades no Distrito Federal, possibilidades ainda no Pará, limpa impressionante e renovação com grande bancada no Senado, aiores aumentos nas bancadas parlamentares naCâmara.

A frustração veio da expectativa criada pelas pesquisas de uma eventual vitória no primeiro turno para presidente. Uma análise mais precisa é necessária, a começar pelo altíssimo numero de abstenções e também dos votos nulos e brancos que, somados, superam um quarto do eleitorado. Mas tambémdos efeitos das campanhas de difamação - sobre o aborto, luta contra a ditadura, etc., assim como o efeito que o caso da Erenice efetivamente teve para diminuir o resultado final da Dilma.

A votação da Marina certamente influenciou. A leitura desse eleitorado é complexa, nem de longe se trata de onda ecológica no Brasil - as outras votações dos verdes foram inexpressivas. Juntaram-se varias coisas, desde votos verdes, esquerda light, até votos anti-Dilma, votos desencantados com o Serra, entre outros. Mas o montante alto requer uma análise mais precisa.

Para o segundo turno contam esses votos: mais da metade concentrados em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, além do DF, onde ela ficou em primeiro lugar. Qualquer que seja a decisão de apoio no segundo turno - a convocação de assembléias para definir deve confirmar a tendência a abstenção, tornando mais difícil a operação política da direção de apoiar Serra -, esse eleitorado se orientará, em grande medida, não pela decisão partidária, ficando disponível para os outros candidatos. Em 2006, nem o PSol conseguiu que seus votos deixassem de ir para outros candidatos, desobedecendo a orientação do voto em branco.

É uma ilusão considerar que o segundo turno é outra eleição. É a continuação do primeiro, em novas condições - de bipolarização. A campanha deve ser dirigida diretamente por Lula, deve ser centrada na comparação dos governos do FHC e do Lula, deve ter uma estratégia específica para o eleitorado da Marina e deve multiplicar os comícios e outros atos de massa - um diferencial importante entre as duas candidaturas.

Em 2006 o segundo turno foi muito importante para dar um caráter mais definido à polarização com os tucanos, o mesmo deve se dar agora. Que ele multiplique a votação e a mobilização, para tornar mais forte ainda a vitória da Dilma. Ela é favorita, mas devemos precaver-nos das manobras dos adversários, do uso da imprensa, das campanhas difamatórias.

Pode ser um segundo turno de polarização mais clara também, porque os debates diluíam os temas, na medida em que havia um coro de 3 candidatos colocando ênfase nas denúncias. Não soubemos colocar como agenda central o fato de que o Brasil se tornou menos injusto, menos desigual, com Lula, e que esse é o caminho central a seguir.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

3 de outubro: documentos para votar!

#ondavermelha
Para vencer no 1º turno não precisa mais levar dois documentos!


Importante avisar todo mundo que a obrigatoriedade de levar dois documentos (título eleitoral e mais um documento com foto) está sendo derrubada no STF.

Como sempre fazendo o jogo da direita, o Ministro Gilmar Mendes pediu vistas ao processo e atrasou a decisão final para amanhã. No entanto já votaram 7 ministros e, por unanimidade até agora, estão derrubando a obrigatoriedade.

A ideia de Gilmar deve ser deixar o menor tempo possível para que a população seja informada da mudança e, assim, confundir os eleitores. Não há como mudar o resultado, restam apenas três votos, incluindo o de Gilmar Mendes, a "manobra" é apenas para dispersar!

Leia mais aqui:
(é uma matéria da Carta Capital)

E pra quem quiser uma sugestão de voto, aqui está o link com a cola que eu vou levar para a urna no dia 3 de outubro

Abraços ptistas!
Alcir Martins       

domingo, 26 de setembro de 2010

Corrida de dez dias



24.09.2010
Por Luis Fernando Veríssimo
De hoje à data da eleição teremos dez dias de manchetes nos jornais e duas edições da Veja. Não sei até quando podem ser publicadas as pesquisas sobre intenção de voto, mas até a última publicação - aquela que, segundo os céticos, é a mais confiável, pois é a que garante a credibilidade e o futuro dos pesquisadores - veremos uma corrida emocionante: o noticiário perseguindo os índices da Dilma para tentar derrubá-los antes da chegada, no dia 3. O prêmio, se conseguirem, será um segundo turno. Se não conseguirem a única dúvida que restará será: se diz a presidente ou a presidenta?

Até agora as notícias de corrupção na Casa Civil não afetaram os índices da Dilma. Estou escrevendo na terça, talvez as últimas pesquisas mostrem um efeito retardado. Mas ainda faltam dez dias de manchetes e duas edições da Veja, quem sabe o que virá por aí? O governo Lula tem um bom retrospecto na sua competição com o noticiário. A popularidade do Lula não só resistiu a tudo, inclusive às mancadas e aos impropérios do próprio Lula, como cresceu com os oito anos de denúncias e noticiário negativo. Desde UDN x Getúlio nenhum presidente brasileiro foi tão atacado e denunciado quanto Lula. Desde sempre, nenhum presidente brasileiro acabou seu mandato tão bem cotado.
Acrescente-se ao paradoxo o fato de que o eleitorado brasileiro é tradicionalmente, às vezes simplisticamente, moralista. Elegeu Jânio para varrer a sujeira do governo Juscelino, elegeu Collor para acabar com os marajás, aplaudiu a queda do Collor por corrupção presumida e houve até quem pedisse o impedimento do Itamar por proximidade temerária com calcinha transparente. Mas o moralismo tornou-se politicamente irrelevante com Lula e, por tabela, para os índices da Dilma. É improvável que volte a ser decisivo em dez dias. Mas nunca se sabe. O que talvez precise ser revisado, depois dos oito anos do Lula e depois destas eleições, quando a poeira baixar, seja o conceito da imprensa como formadora de opiniões.
Mas a corrida dos dez dias começa hoje e seu resultado ninguém pode prever com certeza. Virá alguma bomba de fragmentação de última hora ou tudo que poderia explodir já explodiu? O que prevalecerá no final, os índices inalterados da Dilma ou o noticiário? Faça a sua aposta.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Derrotar a direita




E foi neste mesmo discurso que Lula disse que o DEM não deveria mais existir ... aliás o DEM , tem a ARENA no seu dna.... é a "mesma direita", raivosa e golpista, faz tempo!

domingo, 12 de setembro de 2010

11 de setembro

Robert Fisk e o 11 de setembro: Duas guerras, milhares de mortos…

9 anos, 2 guerras, centenas de milhares de mortos…

E não aprendemos coisa alguma?

10/9/2010, Robert Fisk, The Independent, UK // Tradução de Caia Fittipaldi
O 11/9 nos enlouqueceu todos? Nossa homenagem aos inocentes que morreram há nove anos continua a ser um holocausto de fogo e sangue.
O 11/9 nos enlouqueceu todos? O quanto faz perfeito sentido, de um modo alucinado, enlouquecido, que a apoteose da tempestade de fogo há nove anos seja, hoje, um pregador pirado que ameaça nos ferir com outra tempestade de fogo à moda da queima de livros dos nazistas! E ameaça fazer piras de livros do Corão. Ou a campanha contra uma mesquita a ser construída a dois quarteirões do “marco zero” – como se o 11/9 tivesse sido ataque a cristãos que cultuam Jesus, em vez de ataque contra o ocidente ateu.
Mas, afinal, por que nos surpreender? Basta olhar para outros desses doidos que brotam depois de cada crime contra a humanidade: o semidoido Ahmadinejad; Gaddafi, o pegajoso pós-nuclear; Blair com aquele olho direito de maníaco e George W Bush, com suas prisões negras e torturas e a completamente lunática “guerra ao terror”. E o desprezível que viveu – e talvez ainda viva – numa caverna afegã e as centenas de al-Qaedas que criou, e o mullah Omar caolho – para não falar dos agentes lunáticos das agências de inteligência e da CIA principalmente – que não nos salvaram do 11/9 porque foram muito lentos ou idiotas demais para identificar 19 homens que atacariam os EUA. E lembrem: ainda que o Rev. Terry Jones continue persuadido a desistir de queimar livros do Corão, já há vários outros doidos como ele, de plantão, prontos a assumir seu lugar.
De fato, nesse sombrio 9º aniversário – e deus nos ajude, quando chegar o 10º, ano que vem – o 11/9 parece ter produzido só monstros, nenhuma paz, nenhuma justiça, nenhuma melhor democracia. Destruíram o Iraque – os doidos ocidentais e os doidos da cepa local – e massacraram 100 mil almas, ou 500 mil, ou um milhão; e quem liga? E mataram dezenas de milhares no Afeganistão; e quem liga? E enquanto a praga se espalha pelo Oriente Médio e pelo globo, eles – os pilotos da força aérea e os insurgentes, os fuzileiros e os homens-bomba, as al-Qaedas do Maghreb e do Khalij e do Califato do Iraque e as forças especiais e os garotos do apoio aéreo e os degoladores – degolaram mulheres e crianças e velhos e doentes e jovens e saudáveis, do Indus ao Mediterrâneo, de Bali ao metrô de Londres; que homenagem aos 2.966 inocentes que morreram há nove anos! Em nome daqueles mortos, oferecemos o holocausto que produzimos, de fogo e sangue; e, agora, a sandice do pregador doido de Gainesville.
Essas foram as perdas, é claro. Mas… quem ficou com o lucro? Bem, os mercadores de armas, é claro; e as Boeing e Lockheed Martin e os que vendem mísseis e fabricam aviões-robôs e peças de reposição para os F-16 e os mercenários sanguinários que confiscam terras de muçulmanos em nosso nome. Sobretudo agora, quando já produzimos mais de 100 mil novos inimigos para cada um dos 19 assassinos do 11/9. Os torturadores vivem boa vida, gozando seu sadismo nas prisões negras dos EUA – e seria conveniente que, nesse 9º aniversário, o mundo fosse afinal informado de que há um centro de tortura dos EUA, em pleno funcionamento, na Polônia –, homens (e mulheres, temo) que já aperfeiçoaram as técnicas de sufocamento e afogamento mediante as quais o ocidente guerreia as guerras contemporâneas. E, isso, sem esquecer todos os religiosos fanáticos do mundo, sejam do tipo Bin Laden, ou os barbudos do Talibã, sejam os homens-bomba, sejam pregadores malucos grisalhos de gravata como aquele pregador, o nosso maluco, o de Gainesville.
Mas Deus? Onde entra Deus em tudo isso? Um arquivo de citações sugere que todos os monstros brotados do ou criados no 11/9 são seguidores desse quixotesco redentor. Bin Laden reza a Deus – “que faça dos EUA uma sombra do que é”, como me disse, pessoalmente, em 1997 –, e Bush reza a Deus, e Blair rezava – e ainda reza – a Deus, e todos os matadores muçulmanos e milhões de soldados ocidentais matadores e também o “Doutor” (honorário) “Pastor Terry Jones” e seus 30 (talvez 50, porque, nessa “guerra ao terror” as estatísticas nunca batem) seguidores também rezam a Deus. E o pobre velho Deus, é claro, tem de ouvir todas as rezas cujo coro aumenta durante as guerras. Relembremos as palavras atribuídas a Deus, por poeta de outra geração: “Deus isso, Deus aquilo, e Deus sabe-se lá o quê! Santo Deus! Assim, meu trabalho fica pela metade!” [1] E foi só a Primeira Guerra Mundial!
Há apenas cinco anos – no 5º aniversário dos ataques às torres gêmeas/Pentágono/Pensilvânia – uma aluna perguntou-me, numa conferência numa igreja em Belfast, se o Oriente Médio se beneficiaria por lá haver mais religião. Não!, rugi, na resposta. É preciso menos religião! Deus é assunto de contemplação, não de guerras. Mas – e aqui somos jogados contra os recifes e rochas escondidas que nossos líderes querem que não vejamos, que esqueçamos, que as ponhamos de lado – há, sim, esse inferno de sangue que envolve todo o Oriente Médio. São povos muçulmanos que mantiveram sua fé, enquanto os ocidentais, que os oprimem militarmente, economicamente, culturalmente, socialmente – já perderam qualquer fé. Como é possível?, perguntam-se os muçulmanos. De fato, é soberbamente irônico que o Rev. Jones seja homem de fé, enquanto já não há ninguém à volta dele que tenha qualquer fé. Por isso os nossos livros e documentários jamais falam de muçulmanos versus cristãos, mas de muçulmanos versus “O Ocidente”.
E, claro, há o tabu, o tema de que não se pode falar – o relacionamento entre Israel e os EUA, e o apoio incondicional dos EUA ao roubo de terras, porque Israel rouba terras dos árabes muçulmanos todos os dias –, também está no âmago da crise terrível que assola nossas vidas.
Na edição de The Independent da 6ª-feira, viam-se fotos de uma demonstração no Afeganistão em que os manifestantes gritavam “morte aos EUA”. Mas ao fundo, os mesmos manifestantes carregavam um estandarte negro escrito em dari, com tinta branca. Lá se lia – e nenhum jornal ocidental traduziu – “O regime sionista sanguinário e os líderes ocidentais indiferentes ao sofrimento dos palestinos mais uma vez celebram o ano novo com mais sangue palestino derramado”.
É mensagem de violência terrível – mas prova, mais uma vez, que a guerra em que estamos afundados é disputa também da questão Israel-palestinos. Talvez o “Ocidente” prefira acreditar que os muçulmanos “nos odeiam pelo que somos” ou que odeiem “nossa democracia” (é o que sempre mentiram Bush, Blair e uma horda de políticos mentirosos) – mas o conflito entre Israel e palestinos está no centro da “guerra ao terror”. Porque está. E, porque está, o igualmente vicioso Benjamin Netanyahu, ao reagir às atrocidades do 11/9, disse que ‘o evento’ seria bom para Israel. Israel poderia passar a dizer que, contra os palestinos, lá também se lutava “a guerra ao terror”, e que Arafat – e foi o que disse o hoje semimorto Ariel Sharon – seria “nosso Bin Laden”. Assim, os israelenses puderam atrever-se a dizer que Sderot, sob chuva de mísseis de lata do Hamás, seria “o marco zero israelense”.
Nada disso é verdade. A batalha de Israel contra os palestinos é caricatura fantasmagórica da “guerra do terror” do “Ocidente”, mediante a qual o Ocidente dá apoio ao último projeto colonial do planeta – e aceita os milhões de mortos –, porque as torres gêmeas, o Pentágono e o avião da United voo 93 foram atacados por 19 assassinos árabes há nove anos.
Há uma horrenda ironia no fato de que um dos resultados diretos do 11/9 tenha sido a legião de policiais e agentes e ‘especialistas’ que voaram imediatamente para Israel para aprimorar sua “expertise antiterroristas” com a ajuda de oficiais israelenses que muito provavelmente – nos termos divulgados pela ONU – são criminosos de guerra. Não surpreende que os heróis que fuzilaram o infeliz Jean Charles de Menezes, brasileiro, no metrô de Londres em 2005 estivessem recebendo assessoramento “antiterroristas” dos israelenses.
Ah, sim, já sei o que vão dizer. Que não podemos comparar a ação de terroristas do mal e a coragem de jovens policiais ingleses, homens e mulheres, que defendem vidas inglesas – e sacrificam as próprias vidas – nos fronts da “guerra ao terror”. Não há comparação. Não são “iguais”. “Eles” matam inocentes, porque “eles” são o mal. “Nós” matamos inocentes… por engano. Mas nós sabemos que vamos matar inocentes – aceitamos a evidência de que mataremos inocentes, que nossos atos criarão valas comuns nas quais se enterrarão famílias inteiras dos mais pobres, dos mais fracos, dos mais desamparados.
Por isso inventamos o conceito obsceno de “dano colateral”. Porque se “colateral” significar que aqueles mortos são inocentes, então “colateral” também significaria que os que os assassinam também seriam inocentes. Não queríamos assassiná-los – por mais que sempre soubéssemos que os assassinaríamos. “Colateral” é nossa licença para matar. Essa única palavra faz toda a diferença entre “nós” e “eles”, entre o nosso direito divino de matar e o direito divino de Bin Laden matar. As vítimas, ocultadas como cadáveres “colaterais”, já nem se contam, porque são provas do nosso crime. Talvez lhes tenha doído menos. Talvez morrer por tiro de avião-robô seja morte mais doce, partida mais suave desse vale de lágrimas. Ou, quem sabe, ser cortado ao meio e eviscerado por um míssil AGM-114C Boeing-Lockheed ar-terra doa menos do que voar pelos ares aos pedaços por efeito de uma bomba no acostamento ou de algum cruel homem-bomba que se suicide na rua.
Por isso é que sabemos quantos morreram no 11/9 – 2.966, e o número talvez seja maior – mas nem contamos os mortos que nós matamos. Porque eles – “nossas” vítimas – nem são identificáveis, nem são inocentes, nem são humanos, não têm causas, nem crenças, nem sentimentos; e porque já matamos muito, muito, muito mais gente que Bin Laden e os Talibã e a al-Qaeda.
Aniversários são eventos para jornais e televisões. E parecem ter o mau hábito de se unirem sempre em cenários trágicos. Assim os ingleses comemoram a “Batalha da Bretanha” – episódio cavalheiresco da história dos britânicos – e a “Blitz”, bisavó dos assassinatos em massa, mas símbolo de uma espécie ingênua de coragem –, como lembramos o início de uma guerra que rachou pelo meio a moralidade pública, converteu políticos britânicos em criminosos de guerra, nossos soldados em assassinos e nossos inimigos em heróis da causa contra o Ocidente.
E, ao mesmo tempo em que, nesse tormentoso aniversário, o Rev. Jones prega que se queime um livro intitulado “Corão”, Tony Blair está em campo para vender um livro intitulado “Uma jornada”. Jones disse que o Corão seria “o mal”. Muitos britânicos perguntam-se se o livro de Blair não deveria chamar-se “O Crime”. Não há dúvida de que o 11/9 já virou delírio, se o Rev. Jones consegue atrair a atenção dos Obamas dos Clintons, do Santo Padre e até da ainda mais santa ONU. Aqueles que os deuses querem destruir, os deuses primeiro enlouquecem…
[1] No orig. “God this, God that, and God the other thing. ‘Good God,’ said God, ‘I’ve got my work cut out’. São versos conhecidos na Inglaterra como “a quadrinha da [primeira] Grande Guerra”, de autor desconhecidos, mas atribuídos a J.C. Squire, depois Sir John Squire.